O Senado acelerou a tramitação da PEC (Proposta de Emenda à Constituição) que institui o marco temporal para demarcação de terras indígenas, ao aprovar, nesta terça-feira (9), um calendário especial para levar o tema diretamente ao plenário da Casa e permitir sua deliberação de forma expressa no mesmo dia.
O texto, que ainda precisa passar pela Câmara dos Deputados (onde tem amplo apoio), inclui na Carta Magna a restrição de que os territórios devem ser demarcados apenas conforme sua ocupação no ano de 1988. A previsão é criticada por movimentos dos povos originários e defendida pelo agronegócio.
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Já com a sessão em andamento, o senador Esperidião Amin (PP-SC), publicou um novo relatório do tema, que inclui a previsão de indenização a fazendeiros, veta a ampliação de territórios e prevê a participação de proprietários rurais durante todo o processo de demarcação.
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A votação acontece em um momento no qual o Congresso vive tensão com o STF (Supremo Tribunal Federal) que também tem na pauta desta semana, na quarta-feira (10), uma sessão sobre o marco.
A disputa foi desencadeada após o ministro Gilmar Mendes decidir, de forma monocrática, retirar dos parlamentares o poder de abertura de impeachment de ministros da Corte, limitando essa possibilidade apenas à PGR (Procuradoria-Geral da República).
Em resposta, o presidente do Senado e do Congresso, Davi Alcolumbre (União Brasil-AP), pautou uma série de projetos que são focos de tensão com o Supremo, inclusive o marco temporal.
O texto estava parado na Comissão de Constituição e Justiça (CCJ) desde julho de 2024. Com o calendário especial, pode ir direto ao plenário e ser deliberado em dois turnos de uma vez só --tradicionalmente, a tramitação acontece em duas votações, separadas por cinco sessões.
A proposta de calendário especial partiu da senadora Tereza Cristina (PP-MS) e foi aprovado por 48 a 21. PT, MDB, PSD e a bancada do governo foram contra a tramitação expressa.
A instituição do marco temporal impacta terras indígenas que, somadas, acumulam quase 11 mil requerimentos de mineração.
O marco temporal é a tese segundo a qual os territórios indígenas devem ser reconhecidos de acordo com a ocupação deles no ano de 1988, quando a Constituição Federal foi promulgada.
Os povos criticam essa ideia e defendem que o direito ao território é anterior ao texto constitucional, portanto sua demarcação deve respeitar estudos antropológicos que determinem a área que cada grupo habita originalmente.
A Frente Parlamentar da Agropecuária, fiadora da bancada ruralista e maior grupo do Congresso, é a principal defensora do marco e também havia marcado para esta terça uma reunião para debater o tema.
Originalmente, o texto da PEC tinha um único dispositivo para prever, no artigo 231 da Constituição, que estringiu os direito dos povos apenas à áreas ocupadas no "marco temporal de 5 de outubro de 1988".
Em seu último relatório, Amin manteve o marco "na data da promulgação desta Constituição", mas vetou a "ampliação [dos territórios] além dos limites já demarcados".
Ele também incluiu dois outros dispositivos, um deles para prever a possibilidade de que a União tenha que indenizar os proprietários rurais caso a desapropriação das terras seja necessária, inclusive em casos em que a área seja ocupada por posseiros ou se enquadrem como terra nua, ou seja, nunca tenha sido explorado por alguém.
O outro prevê que todo o processo de demarcação, que é realizado por órgãos indigenistas a partir de estudos antropológicos, possa ser autuado e tenha a participação inclusive de municípios, estados e também dos fazendeiros.
A aprovação concomitante no STF e no Parlamento espelha o que aconteceu nos últimos anos, também diante de tensão entre os poderes.
Em 2023, o Supremo julgou inconstitucional a tese. Em reação, o Congresso votou e aprovou um projeto de lei que instituiu o marco.
Após a aprovação do projeto, críticos e defensores acionaram o STF para ou derrubar ou referendar o texto.
Foi justamente nesse contexto que parlamentares articularam a apresentação da PEC, que recebeu o número 48.
O argumento é justamente que incluir o marco temporal no texto da Constituição impediria o Supremo de avaliar a tese como inconstitucional.
No Supremo, o caso está sob relatoria de Gilmar, que criou uma mesa de conciliação para encaminhar o assunto.
O ministro, que é um defensor da tese, chegou a propor a regularização da mineração dentro de terras indígenas, o que hoje não é permitido, mas recuou.
Agora, o STF encaminhou a ideia de apresentar um novo projeto de lei ao Congresso para tratar do tema. As sessões marcadas para esta semana na corte são para debater o tema, mas não há votação prevista.
